quarta-feira, agosto 30, 2006

ego eco

Estou no de noite. É no quando vai ficando pertinho do a hora de dormir. E, mais importante, é ainda no aquele dia, que é o hoje tanto quanto é o antes. Hora estranha! Mas nem dá medo. Ou, se dá, é um pouco só. No antigamente, devia de ser o tempo terrível. Dizem que nem luz, e até nem poste e nem rua, não tinham as gentes. Ficavam lá, vela acesa, ouvindo nada. Já pensou?
Por graça, vivo no agora – este nunca – iluminado. Mas confesso, faz pouco, fabriquei um escuro. Baixei as cortinas, liguei umas velas rosadas, liguei na tomada uma peça tocada ao cravo, esquentei a água, fiz o chá e postei-me diante deste artefato de plástico, esperando o sono ou a revelação. Fechei muitas vezes os olhos, bebericando a poção de maçã fervida. Estive a fazer perguntas. Daquelas! Ninguém respondeu quem sou, para onde vou, de onde vim... Tampouco chegou o correio eletrônico marcando a hora do encontro. Aquele!

Pelo que, tenho a dizer, em nova confissão: a liberdade é uma dádiva. Mas viver assim, no mundo prometido é, por vezes, assustador. Aí vem o medo. Vem o esquecimento. Com eles vem a choramingação. Ao invés de livre, me chamo solitário. Ao invés de presente, me digo à espera. Ao invés de ser, digo sou.

segunda-feira, agosto 28, 2006

Escreverei sobre a solidão. Isto está decidido. Porém, não encontro um mote. Falta alguma providência, para o assunto tomar seus rumos. Falta. É isto! Escreverei sobre faltas, ausências, esperas. E o farei em meio aos ruídos produzidos pelos outros, os todos, os vizinhos, os passeadores, os motoristas, os vira-latas e os cães prisioneiros.
Devo estar atento. Há aqui uma ameaça de erro. É fácil cair no embuste, na falsa crença, na idéia de estar entre eles, bastando para tanto um grito, sopro ou assobio. Sou eu – poderia dizer, enquanto estivesse flutuando em direção às ruas. Sou eu – gritaria o corpo sonhado, braços estendidos, colo macio. Se assim fosse...
Vejam só. Fico ruminando. Sinto uma dor nas asas. O tema escorre pelo nariz. Quase me afogo. Lamento e o meu lamento é bem silencioso. É um quase, é um tremorzinho. Calma – penso. Expiro longamente, afrouxo o pescoço, fecho os olhos um pouco. Rendo-me. Resumo.
A falta é de doçura. Ausente, então, é o doce. Doce é a espera de ser.

quinta-feira, agosto 24, 2006

Mais uma? Pode ser.

E nas ruas, na noite depois da noite, os quatro cães, talvez cinco, viviam. Assuntos. Ou seriam cheiros? Sei não, sei nada, quatro ou cinco não perguntas, andavam, de quatro. De minha parte, com as duas pernas encharcadas de amor represo os vi, quatro ou cinco, grandes, caminhantes, um manco e os outros. Foi quando pensei: há mesmo uns seres homens. Eles deviam ter sido e até acabaram sendo o que deviam, tanto que se contam. Na verdade contada, são tudo o que não foram. Bebem até, sobre o assunto, uns líquidos engarrafados. Depois se despedem em quase beijos. E aquele este, que não é cachorro, esconde a história. Todavia, esconde direito, por escrito, não sem antes cheirar o dicionário e rever diferenças entre encharcar e enxarcar. Não sem antes saber diferença entre o que pode e o que não pode ser dito. Cão sem antes...

quinta-feira, agosto 17, 2006

...

É depois do dia. A pele respingada tremula. As batatas cortadas em quatro, a cebola em grandes pedaços, o azeite no além-mar inventado, o sal de outros mares e os restos da água tratada, saltitam na panela antiga. Lá, dentro do escuro, bilhões de substâncias engendram-se ao som brando do fogo.

É depois da guerra. A terra foi tocada pela escuridão da guerra. As máquinas vão se retirando do campo. Alguns soldados sorriem. Seus dentes querem ser um véu a empalidecer o horror tatuado em suas gargantas.

É depois do calor de agosto. A chuva fina é prenúncio da estação prometida. Todavia, paira sob o céu estrelado, uma ameaça de deserto.

É. Depois de tudo, resta-me sorver a sopa e oferecer essas letras embaralhadas.

sábado, agosto 12, 2006

Ah! – é uma guerra.
Quero dizer direito.
O dito fica do avesso.

sexta-feira, agosto 11, 2006

Há guerra.
Sobre tanto quero escrever um contra-manifesto a favor do direito ao avesso: o nada.
Tenho dito...

quinta-feira, agosto 10, 2006

...um modo infalível de acabar com uma briga é perdê-la...

domingo, agosto 06, 2006

...

Em 06 de agosto de 1945, meu pai completou nove anos na Terra. Em 06 de agosto de 1945, um mundo acabou no Japão.
Em 06 de agosto de 2006, meu pai completou setenta anos na Terra. Em 06 de agosto de 2006, qual mundo acabou?

sábado, agosto 05, 2006

seca a gosto

Uma lufada e, depois, mormaço. Ao grito sucede o sussurro. O ponto se oculta em um traço.

Um mormaço e, depois, a fresca. Sussurra um quase vento. Traço e rabisco, rascunho uma chuva. Em milhões de pingos, a nuvem desfaço.


&

Duas agulhas tremem. Tiquetaqueiam mensagem cifrada. Pedem alforria. Anseiam tecer um novo bordado. Querem deixar a senzala.Querem soltar-se do tronco, preso a um cristal de quartzo.

Dez dedos tremem. Dedilham mensagem cifrada. Pedem alegria. Anseiam tecer um brocado. Querem dizer: não há tempo, não há pedaço.

sexta-feira, agosto 04, 2006

chuvisco

quarta-feira, agosto 02, 2006

nos primeiros de agosto


No oriente e nos outros desertos, próximos, corre sangue muito, em tempo de chuva pouca. Todavia, o pão e o vinho, a música e os sonhos, os amores e o amor, e outros muitos pares dirigem-se à pista iluminada.
Até o instante último – insinuam as forças – há o poder de inventar novas danças.
Nada se pode fazer para abrandar a seca, senão irrigar os campos. Nada se pode fazer para parar a guerra, senão deixá-la em paz. Nada se pode fazer para adiar a morte, senão respirar.