segunda-feira, setembro 25, 2006

Semana passada fui com meu filho-menino-homem até a porta daquele lugar. E fiquei lá, escorado nos muros, esperando o tempo grande de seus exames para o serviço militar. Entre um tremor e outro, li Salman Rushdie. Pensei – uma vez pensei ser aquela a última vez. Voltei à manhã horrenda de me ver visto, vistoriado, invadido pelos homens armados. Pensei – quando ele nasceu nem pensei que ele teria de pensar. Voltei à noite de esperá-lo sair de um útero, sair de dentro do mistério. Olhei. Vi uns homens-meninos armados, balançando-se, correndo, louvando um pano grande, homenageando as guerras. Li dezenas de histórias em Shalimar, o equilibrista, inspirando e expirando, maravilha da literatura e horror da guerra, beleza e feiúra. Sonhei. O mundo ia desarmado, esquecido já dos antes, das eras de matança – sonhei. Batalhas, no imaginado, seguiam. Não havia, porém, tolice nessa terra, nesse desenhado. Homens em luta de ser, em buscas de vidas longas, em construção de pontes, em destruição de muralhas, urravam em cada amanhecer, afugentando os pavores, atraindo a eternidade. O sonho de sempre sonhei. Desacordei. Dei-me a uma tristeza, a uma cisma de fracasso, pensando: passaram-se vinte e oito anos desde quando eu tinha dezoito e os meninos ainda têm de ir aos quartéis, ainda há os que dizem que isto é bom para eles, ainda se tem coragem de chamar esta coisa de serviço prestado à pátria. Depois suspirei. Foi de alívio vendo o moço fora de lá, grudado ao telefone, dando notícia de estar livre, pedindo-me: vamos logo, quero abraçar meu amor. Inspirei. Foi querendo dizer, outra vez, minha fé. Expirei: foi-se outra última vez!

1 Comments:

Blogger Tati P. said...

nossa. gostei muito desse, mesmo mesmo! essa reflexões sobre a guerra, muito boas, e a forma de escrever, também.

11:31 PM  

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