sábado, dezembro 06, 2008

(Capítulo)

Houve uma pausa no caminhar em direção ao restaurante, ou na ida ao mercado, ou quando... O fato é a frase: desde quando descobri estar vivo... As reticências postas anunciavam uma tarefa. Ora desejo livrar-me logo dela para poder não-fazer, realizar o estar-em-férias, gozar o até-que-enfim... Todavia, as reticências seguem-se àquela e às outras sentenças. Seguem-me... em um tomar ares, qual fossem os ventos desta primavera extravagante: frios e criadores de instantes: frios e intensos: instantes. Vejam-me tomando-as, não por sinais gráficos a anunciarem algo que ficará oculto ou deixado ao depois, porém qual fossem um ciclope aprisionado por eras, neste momento tomado como montaria por um ginete cego. Vamos... Avante... Viemos já até este sítio então não podemos mais desistir. Somos dois seres sobrepostos – qual a alma e o corpo do homem a crer – com um único olho a nos servir de guia. Não se carece nada mais. Isto desde a descoberta, aquela, a de estar-se vivo. Nos avessos da mente a verdade esteve sempre inscrita, guardada no ponto-centro ao qual só se pode chegar depois de rodar por lugares e neles viver coisas: acasos, encontros, dissabores e gozos. Em dia claro, a tal se moveu deixando o dono da cabeça – casa-da-mente – muito assombrado. Ele teve a impressão de perder-se em terra estranha. Viu-se cercado/invadido por seres/outros vivos. Ocupavam-no com propósitos de dele extraírem a seiva necessária para seguirem seu próprio caminho. Emissários da vida-após-a-vida, noticiam estar a vida presente: no agora-aqui. Voltemos... Foi um belo trote – pensa o ginete. Nem me doem ainda os ombros – comemora o ciclope. Façamos uma pausa. Há música por aqui. Podemos ouvi-la enquanto buscamos entender o que nos trouxe ao mundo. Já não me ocupo com isto, desde... Quanto a mim, pretendo ainda entender... Ei-las de volta, sinalizando caminho. Vamos tentar o improvável? Faça-se leve – pede o até então cavaleiro. Farei meu melhor – concede aquele que nunca antes imaginara a possibilidade de percorrer qualquer caminho senão com pés no chão. É flutuar, mas temo – ao sentir-me além-do-ser-corpo-denso-de-forças-fraquezas-e-sangue-em-veias-ar-em-tubos-substâncias – e tremo... Deixe-me, só por mais um instante carregá-lo, oh corpo meu, assim mesmo a tremer na febre dos medos meus-e-seus, qual fôssemos afinal dois: eu-e-o-eu. Eia! Eia! Eia! Ao lago! Leva-me alma minha ao reconforto do vagar em águas, doces águas. Nelas um novo repouso, outro breve esquecimento, outros pontos enfileirados em justa ordem... Calma – ouviu-se no som das águas sem ondas, sem corredeiras, repousadas entre rochas quietas. Aos sonhos – disseram-se os personagens sonhados. O com olho único cerrou-o. O possuidor de dois, que nada vê, insistiu no mantê-los abertos à escuridão da tarde. No sono, o ciclope pode ver-se no lago – espelho. O cavaleiro reconheceu-se em ecos. Calma...
Perdido. Entre os pensamentos e as falas – eis onde estou. A noite chegou, tão fria quanto o dia, tão fora de propósito quanto as outras horas vividas em outras partes deste hoje. Fiz um esforço danado para entender umas mensagens cifradas e traduzi-las para idioma familiar. Pequenas dores, apesar de poetizadas, persistem. A dor é presente – momento e dádiva. Ela localiza o corpo no corpo. Mostra distâncias. Denuncia qualquer dissipação de forças. Todavia....